quarta-feira, 23 de julho de 2014

Quando se desligava o motor da estável chata de chapa à deriva, acertava-se o passo com a corrente constante do Rio, só assim o tempo parecia parar, só assim também o silêncio parecia poder ouvir-se, flutuava-mos à velocidade das ilhas de vegetação que se desprendiam das margens, os crocodilos mantinham-se assim serenos os hipopótamos também, parecia que só o motor desligado podia fazer sincronizar a nossa estranha presença com a vida do Zambeze. Perguntei a quem de pé pescava numa instável piroga que se volta até com a esteira de uma pequena embarcação como a nossa, se não tinham medo de pescar ali com os crocodilos, esperava uma resposta segura e confiante de quem com experiência e desenvoltura dominava aquele meio, mas a resposta do pescador desarmou-me _" Sim tenho, mas se não pescar quando voltar a minha família não tem de comer"

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Mais à frente, guiados pela corrente passamos novamente por baixo da ponte Armando Emílio Guebuza, algumas milhas depois chegamos a uma bifurcação. Um braço do Zambeze segue pela esquerda, acredita-se que fosse por esse sentido que os exploradores portugueses tenham passado e fosse também esse o rumo do Rio dos Bons sinais que os levaria até Quelimane, ou talvez não! É afinal bem provável, que em 1885 quando a comitiva de Capelo e Ivens por aqui passaram que o Rio dos Bons Sinais já não fosse um braço do Zambeze tal como o fora cerca de 400 anos antes quando Vasco da Gama na sua foz assim o baptizou pelo facto de aí ter tido finalmente informações precisas de que estava certo no rumo que tomara na descoberta do caminho marítimo para a India. Afinal cerca de 130 anos depois o Zambeze nunca fora a auto estrada entre o Índico e o Atlântico que Capelo e Ivens haviam sonhado para escoar a matéria prima que alimentaria os fornos da revolução industrial que de facto mudou o mundo, mas o comboio e o barco a vapor cederam lugar ao automóvel e ao avião, dobrar o Cabo da Boa Esperança já não foi uma imposição, percorrer do Cairo ao Cabo na linha de caminho de ferro Inglesa não chegou a passar de um desenho e a nossa Linha de Benguela iniciada em 1899 (Angola 1899) nunca se chegou a cruzar com ela nem a unir-se com a Linha da Beira (Moçambique 1899. Nas margens do Zambeze com arpões, canas, redes e pirogas escavadas de troncos de árvores as gentes do Zambeze mantêm a forma de vida e as artes de pesca tal como no tempo da última epopeia dos Portugueses.

terça-feira, 15 de julho de 2014

Primeiro rumamos a montante, o pequeno motor de poucos cavalos já cansados mal conseguia vencer a corrente, no entanto, olhando as ilhas da vegetação flutuante do Zambeze que se deslocavam para jusante, o pequeno bote de chapa parecia planar. Passamos a meu ver, perto demais de um hipopótamo fêmea que vigiava os filhotes, nunca me passou pela cabeça temer hipopótamos até ouvir algumas histórias nas vésperas de partida para África. Mais à frente um banco de areia fez o motor parar. A corrente trouxe a embarcação de volta, as orelhas da fêmea estavam outra vez cada vez mais próximas. Nos peluches do IKEA ou mesmo nos documentários da Nacional Geographic as feições dos hipos sempre me pareceram "fofas" mas não aqui! Nesta altura, calculava eu traçando coordenadas com referências na vegetação das margens, devia-mos estar com o casco do bote de motor calado mesmo por cima do dorso da fêmea! Olhei a cara do timoneiro rodesiano experiente que também não me confortou. A corrente que tão depressa nos colocou sobre apuros depressa igualmente nos afastou deles. Pouco depois o motor acordou e seguimos agora ajudados pela corrente em direcção da foz.